quinta-feira, 16 de julho de 2009

Fornos de carvão na margem da lagoa das Furnas







Vida Antiga e Actual Ligada à Actividade do Carvão nas Furnas


Nas Furnas, actualmente, o sector primário, na área da agro-pecuária, é o principal vector económico, embora o Turismo seja uma actividade que, nas últimas décadas se encontra em forte crescimento, revelando-se um importante factor de desenvolvimento para os habitantes locais.
Mas há 40, 50 anos atrás, época em que se produzia Carvão em Fornos com vista à comercialização, a vida não era fácil, o trabalho duro era herança comunitária de todos, não havia muitos transportes (praticamente todos andavam a pé) e o fabrico desta matéria estava ligado a pessoas de um nível social baixo e servia para a obtenção de dinheiro extra, algo que escasseava na altura.
Estas aberturas de exploração à natureza revelavam-se um meio de fornecimento para as comunidades locais ou mesmo mais afastadas, enquanto proviam emprego e sustento para várias famílias.Por outro lado beneficiava de uma procura relativamente elevada, sem os meios energéticos alternativos que são do nosso conhecimento.
Eram geralmente os homens quem se dedicava á apanha da lenha que depois seccionavam em toros de cerca de 50 centímetros aos quais ateavam fogo e deixavam arder abafados dentro desta espécie de algares artificialmente construídos. O carvão obtido era depois transportado e pesado para venda.
Com o advento de uma nova era os combustíveis alternativos foram tornando o carvão cada vez menos necessário e hoje em dia estes fornos abandonados não passam de apontamentos na paisagem.



Localização e Formato dos Fornos


Regra geral, os fornos de carvão vegetal erguem-se na periferia da freguesia. Situam-se na margem da lagoa das Furnas. A razão da sua localização prende-se com o facto de a zona referida ser abundante em madeira e ainda por constituírem, junto ao povoado, um grave perigo de incêndio.
Dos restos de fornos que visitei, apenas dois, dos cinco existentes, ainda se encontram em bom estado, apresentando cerca de 3 metros de altura e três metros de diâmetro, estão construídos em pedra, aparelhada com barro (visto este ser um bom refractor de calor).
Á distancia, o forno apresenta uma estrutura cilíndrica, com uma pequena abertura no topo, onde seria colocada uma tampa de ferro tendo aposta à sua parte traseira uma chaminé. Nas laterais colocava-se terra aglomerada com a finalidade de conservar o calor.
Um dos lados possuía ainda uma pequena entrada por onde se tinha que introduzir o homem responsável por colocar a madeira, sempre de dentro para fora e de baixo para cima.
Interiormente, apresenta uma forma abobadada.
Frequentemente, sob a acção repetida do calor estes fornos detioravam-se e tinham que ser recompostos pela própria população.


Funcionamento dos Fornos / Fases do Fabrico do Carvão


Apesar de haver breves memórias, por parte dos informadores, foi-me dito que todo o funcionamento e o processo do seu fabrico, passava primeiro pelo derrube de árvores e por partir os enormes troncos em pequenas achas de madeira, cujo comprimento não devia ultrapassar os 50 cm de comprimento e os 20 cm de largura.
Em seguida eram colocados essas achas no interior dos fornos (há memórias de que cada forno chegava a levar três toneladas e mais) de que resultariam, no fim, uns quatrocentos e cinquenta quilos de carvão, por forno.
Depois do forno, estar completamente cheio, era incendiado, na parte superior era colocada então a tampa de ferro e era fechada a entrada por onde eram introduzidas as achas , não se devia atear o fogo mas abafá-lo, porque o segredo era ir queimando devagarinho, uma combustão lenta significava que a lenha se ia transformando em carvão e não em cinza. Os informadores não souberam ao certo quanto tempo durava todo este processo.
Uma certeza havia: quanto mais qualidade se queria dar ao carvão, mais tempo demorava a lenha a queimar. Durante todo este processo, tinham os carvoeiros de ser vigilantes, verificando o estado do forno de manhã, ao almoço, à tardinha e à noite, quatro ou cinco vezes por dia.
Ateado o forno, uma das técnicas que era usada, tinha a ver com a abertura de buracos laterais, que abrindo ou fechando servia para adiantar ou atrasar a combustão.
Depois de pronto, o carvão era então retirado e colocado em sacas para comercialização.

Texto tirado de um trabalho realizado por Jorge Alberto Couto, aluno do Curso de Património Cultural da Universidade dos Açores.

Fornos de carvão vegetal das Furnas um património que deve ser preservado e aproveitado para mostrar uma outra faceta da vida dos nossos antepassados.
Nem seria necessário grandes recuperações, apenas mante-los limpos deixando ficar o ambiente que os rodeia como está, o que lhes dá um ambiente muito especial.

domingo, 5 de julho de 2009

Currais de vinha o saber dos nossos antepassados

Segundo Gaspar Furtuoso “ nesta ilha de São Miguel não costumam fazer vinhas senão sobre pedras que, no tempo passado, com terramotos e incêndios de enxofre e salitre, e outros materiais, brotaram de debaixo da terra e correram em ribeiras de fogo sobre a superfície dela, as quais resfriadas da quentura com que corriam, ficaram feitas pedras e áspera penedia, sobre a qual pelo tempo adiante se criou e nasceu basto e altíssimo arvoredo, o qual roçando depois os moradores desta ilha, por aqueles biscoitais não prestarem para terra de pão nem de outros legumes, prantaram neles vinhas”.

Foto: JPedro
Foto: Fernando Abreu

Foto: Fernando Abreu


Com sabedoria e criatividade, o micaelense triunfou perante as adversidades da natureza, transformando pedra improdutiva no seu modo de sustento, plantando a vinha, protegendo-a dos ventos fortes e do rossio do mar através da construção de uma estruturada malha de muros, onde sobressaem os “currais”.

O reticulado de muros levantados a partir das rochas expelidas pelo vulcão, associado á excelência dos campos de lava e á vegetação natural, formam uma ambiência suigeneris que impressiona pela sua perfeição. Nesta área o elemento fundamental está espelhado na unicidade estabelecida pela impressionante rede de muros testemunhos de uma sábia forma de rentabilização de recursos, e que formam uma teia perfeitamente ordenada, constituída por um rendilhado de muros de pedra negra, onde se encontram desenhados os “currais”.


MEDEIROS, Carlos Alberto, Contribuição para o estudo da vinha e do vinho nos Açores, Finisterra, XXIX, 58, 1994.

O que resta dos antigos currais de vinha de S. Caetano e Quinta da Glória, na zona de Rosto do Cão em São Miguel.

domingo, 28 de junho de 2009

Casa da Grená, um património em vias de desaparecer

Direitos reservados
















Em 1832 um inglês descobre e maravilha-se com a zona envolvente da lagoa das Furnas, aí compra uma grande extensão de terreno para construir uma casa. Esta construção no entanto só aconteceu mais tarde com outro proprietário, o Cônsul inglês de Ponta Delgada, de seu nome Vines, no ano de 1858.






Aí construiu uma casa e deu início nos terrenos circundantes a um jardim, a esta propriedade deu o nome de Grená, onde vinha passar o verão com a família. Este nome tem haver com a esposa do cônsul que era sobrinha do politico irlandês Daniel O’Connel que organizou o movimento católico na Irlanda, tendo a senhora passado a juventude em Killarney numa estancia da família cujo nome era Grená, o Cônsul Vines em agrado á esposa deu esse nome á sua casa de verão na lagoa das Furnas.






Após a morte do cônsul Vines, esta é cedida em 1874 a um cirurgião de Londres chamado Hinton, que publicou na altura várias obras sobre os órgãos auditivos e higiene. Isto porque D. Catharina após a morte do marido não voltará mais às Furnas. Com a morte do cirurgião Hinton em 1875 a Grená passa para Jorge Brown que a explora como hotel durante o verão durante alguns anos. Durante este período acolheu alguns viajantes estrangeiros importantes entre os quais a escritora inglesa Alice Backer que escreveu o livro “A Summer in the Azores with a glimpse of Madeira” , entre outros como alguns que deixaram referências literárias e cientificas sobre as Furnas. Em 1882 a Grená é vendida pelo filho de D. Catarina a Jorge Hayes após a morte de Jorge Brown neste ano. Sendo mais tarde alugada por José do Canto enquanto este construía a sua casa do outro lado da lagoa e preparava a sua propriedade e a construção da ermida de Nossa Senhora da Vitória.






Informação tirada do livro de CORRÊA, Marquez de Jacome, Leituras sobre a história do Valle das Furnas, São Miguel, Oficina de Artes Gráficas, 1924.

O que é o património? Eis algumas respostas simples, por Simon Thurley

PÚBLICO - EDIÇÃO IMPRESSA - CULTURA
Director: José Manuel FernandesDirectores-adjuntos: Nuno Pacheco e Manuel Carvalho
POL nº 5475 Terça, 22 de Março de 2005


O presidente do English Heritage, o instituto britânico do património,esteve em Portugal. Simon Thurley diz que o grande desafio é convencer as pessoas a não trabalharem contra o desenvolvimento económico.
Para este especialista, "o património são as pessoas". E o futuro.

Por Lucinda Canelas

Simon Thurley, o presidente do English Heritage, o equivalente britânico ao Instituto Português do Património Arquitectónico (Ippar), esteve três dias em Portugal a visitar mosteiros e palácios. Ippar e English Heritage assinaram um protocolo de cooperação porque, segundo Thurley, têm muito a aprender um com o outro. Não é para menos: Portugal e o Reino Unido nunca trabalharam juntos nesta área. Thurley, 42 anos, dirige desde 2002 um dos maiores e mais conceituados institutos do património do mundo - é responsável por mais de 400 monumentos e sítios, recebe do governo 177 milhões de euros por ano e tem 11 milhões de visitantes.
Ex-director do Museu de Londres, Thurley diz que os britânicos se interessam cada vez mais pelo património e que os organismos que o tutelam se devem preocupar mais em "gerir a mudança" do que em tentar impedir que ela aconteça. "O património são as pessoas e o que elas investem nos tijolos."
É autor de livros sobre edifícios históricos e, considerado um comunicador nato, já fez vários programas de televisão para a BBC sobre património. Um deles, no ano passado, foi visto por mais de 1,5 milhões de pessoas. Um homem que fala da necessidade de comunicar e ter lucro sem complexos.

PÚBLICO - O que é que aproxima o English Heritage e o Ippar?
SIMON THURLEY - O English Heritage já trabalhou com todos os países da Europa dos 15 à excepção de Portugal, o que é muito estranho. Pelo que pude perceber, são provavelmente mais parecidos que qualquer outras duas organização de património da Europa: ambos têm de cuidar de monumentos, classificar edifícios e planear.
Que projectos quer realizar com o Ippar?

Ainda é cedo para adiantar pormenores. A maioria dos sítios do English Heritage são muito mais comerciais do que os do Ippar. E nós temos muito a aprender com a forma como o Ippar classifica os edifícios.

Em que medida?

Em Portugal, o processo de classificação é público, o proprietário é consultado. Em Inglaterra tudo é feito em segredo. Só se sabe que o edifício foi classificado quando o proprietário recebe uma carta. Não devia ser assim. O sistema português, que é mais discutido, é melhor, apesar de mais burocrático.No Reino Unido quanto tempo demora classificar um edifício?
Uma semana, um mês...
Em Portugal pode levar dez anos...
É um dos custos da consulta pública. Gostávamos de ter um sistema que não fosse tão lento como o vosso mas igualmente aberto.
Qual é o vosso principal objectivo?
Garantir que o "ambiente histórico" é passado às gerações futuras tal como chegou até nós ou melhor. Passamos muito tempo a identificar os bens que queremos salvar e as soluções para a sua conservação.

O que é que quer dizer exactamente com "ambiente histórico"?

Preferimos usar "ambiente histórico" porque abarca tudo: paisagens, jardins, parques, sítios arqueológicos, edifícios medievais, palácios do século XVIII, arranha-céus dos anos 60.

Quantos bens têm de gerir?

Temos 420 sítios de gestão directa abertos ao público. Mas temos cerca de 400 mil edifícios classificados e 30 mil sítios arqueológicos.

Quais são os principais desafios que o património britânico enfrenta?

A Inglaterra está a atravessar um período de profundas transformações económicas, o que cria uma grande pressão nas infra-estruturas: estradas, aeroportos. Todos estes equipamentos têm potencial para afectar o património. O nosso desafio é fazer com que estas transformações melhorem o "ambiente histórico".

Qual é a chave para conciliar "ambiente histórico" e desenvolvimento económico?
Convencer as pessoas de que é melhor trabalhar com o "ambiente histórico" do que contra ele.
O financiamento não é um problema?
É um problema enorme. Este ano recebemos do Governo 177 milhões de euros e tivemos de receitas próprias 72,4 milhões. Mas as contribuições do Governo estiveram congeladas durante dez anos...
Os trabalhistas apoiam o património?

Não temos sido bem financiados, mas espero que no futuro venhamos a ser porque o nosso trabalho é reconhecido assim como o papel social do património.

Qual é o vosso ponto forte?

A mais-valia está na nossa grande experiência comercial. O sistema de protecção do património costumava ser um dos mais avançados. Hoje não é. É por isso que é preciso reformá-lo.

Que reforma é essa?

A conservação tinha a ver com preservação - impedir que as coisas acontecessem. O que queremos agora é mudar a forma como as pessoas pensam a conservação - ela tem sobretudo a ver com a gestão da mudança. É ela que cria a história e, por isso, o "ambiente histórico". Temos de ajudar as pessoas, que se interessam cada vez mais pelo património, a aceitar a mudança.

Como é que explica esse interesse?

Com a própria mudança. O desenvolvimento económico faz com que as pessoas olhem para trás à procura do que é permanente.

O que é que define o património?

As pessoas. Há dois erros comuns no que diz respeito ao património. O primeiro é pensar que é sobre edifícios - é sobre as pessoas e o que elas investem nos tijolos. O segundo é pensar que é sobre o passado - é sobre o futuro, o que ficará depois de nós desaparecermos.